Lembro-me de ti. Os contornos do teu rosto e o timbre da tua voz são assustadoramente claros, como se ainda ontem tivéssemos estado juntas (e já voaram tantos anos).
Lembro-me que gostava quando passeávamos a manhã inteira, quando me ajudavas a fazer bolinhos ou quando me acordavas com beijinhos.
Quando chegava o fim do dia e te ias, ficava à janela a ver-te partir.
Todos os dias.
Durante 10 anos, os 10 primeiros da minha vida, a única luz desta infeliz criança era a ideia de um dia poder fugir e ficar contigo. Deve ser por isso que hoje me lembro. Ou talvez seja porque, quando partiste, vieram à tona as mentiras, os interesses por detrás de cada abraço, cada carinho, cada uma das delícias que constituíam a minha única fonte de felicidade... Os gestos são ocos, se não fundados sobre as estacas de um sentimento puro. E, quando eu soube que tais estacas não existiam, tudo o que tinha de mais querido na minha ainda curta vida foi varrido num sopro...
Diz-me - como foste capaz? Eu não merecia. Era muito jovem e gostava demasiado de ti para que a tua traição não ficasse presa a mim como uma lapa... para sempre. Mataste a minha fé nas pessoas sem piedade. Como foste capaz?
De qualquer forma, mais do que lembrar-me de ti, lembro-me de ti hoje. Parabéns. Sê tão feliz como me fizeste, um dia, ser.